Diogo Molina tem 19 anos, é estudante de enfermagem na Universidade Paulista de Sorocaba, no interior de São Paulo.
Por Rodrigo Lucas
Antes de começar a carreira como aspirante a enfermeiro, Diogo já atuou como apresentador do programa de TV Noite Livre, exibido na TV Latinasat, porém decidiu parar de apresentar e se dedicar a uma nova escolha da sua vida que foi a enfermagem, hoje em dia, ele atua como estagiário em um hospital particular paulista e teve que arregaçar as mangas durante a pandemia de Covid-19.
Ele
poderia estar com o microfone na mão, mas preferiu o estetoscópio, para uns uma
escolha errada, para outros certa e para ele é a escolha da sua vida (Foto: Acervo
Próprio)
O maior desafio dos médicos hoje
talvez seja convencer as pessoas de que existe uma pandemia, existe um vírus e
existe vacina. Como lidar com esse público que parece que Tomé, só acredita vendo?
A gente está sofrendo na era da
pós-verdade então é muito difícil você tentar determinar hoje em dia o que é
fato e o que é literalmente fake porque as pessoas não estão buscando
uma base científica, e quando a base científica é apresentada, elas não querem
acreditar seja por motivo político, seja por motivo cultural, então o
fundamento científico que a gente tem que seja ele pela vacina, ou por
tratamentos, ou seja por métodos de prevenção, eles acabam construindo uma
coisa que na cabeça deles a epidemia não passa de uma invenção.
Como vem sendo o seu trabalho como
estagiário no hospital e se você já teve que lidar com pacientes que tiveram
Covid?
Dentro do hospital realizando um
procedimento cirúrgico de cardíaca, neuro, de paciente com sequelas de covid, eu
escutei muito: é verdade que existe tudo isso de gente entubada, tudo isso de
gente internada, enfim é muito além do que a gente imagina, porque o Brasil é
um país muito extenso é desigualdade social está muito presente né, então nem
todos os lugares conseguiram realizar a testagem das pessoas.
Você tem ideia de quantas pessoas com
Covid você chegou a atender no hospital por dia?
Por conta da primeira leva
contaminar muitas pessoas assintomáticas, você acaba não realizando a testagem de
uma pessoa assintomática e hoje em dia principalmente você só realiza os testes
se a pessoa apresenta algum tipo de sintoma. Então a gente tem uma proporção de
pessoas que foram realmente contaminadas, mas não daquelas assintomáticas, o
número pode ser o dobro ou o triplo de infectados, a gente não tem esse
conhecimento até hoje.
Como fazer para se prevenir de
notícias falsas plantadas por pessoas que supostamente dominam conhecimentos
médicos?
É uma coisa que a gente pode se
basear referente a quebra das notícias falsas, são sites com fontes seguras e
profissionais altamente qualificados, sejam cientistas, médicos, enfermeiros, fisioterapeutas
que tenham tido a vivência seja hospitalar quanto a vivência científica, mas
que de fato leve a ciência acima de tudo, porque quando você leva seja uma
religião uma cultura você deixa de ter embasamento científico para ter diálogo
para uma certa discussão.
Atualmente qual é a sua função no
hospital?
Eu sou enfermeiro de centro
cirúrgico, então eu entrei com os procedimentos mais delicados, como
neurocirurgia, cirurgia cardiovascular, cirurgia gástrica, são procedimentos
mais invasivos e durante a pandemia teve uma recepção muito enorme, dos
procedimentos eletivos que são aqueles que não requerem urgência e muito menos
emergência, são os procedimentos que acabaram entrando para gente. Como hospital
particular não tem vínculo com SUS direto, a gente acaba não recebendo tanta
emergência mas as urgências que eram básicas como apendicectomia, que a
retirada da pe-60, vesícula, enfim.
Você chegou a atender pacientes que
tiveram a Covid?
Cheguei a entrar em dois
procedimentos que eu tive que ficar 3 horas em sala trancada com paciente, se
recuperando dentro de sala que foi de uma paciente de 53 anos com sequela pós-covid,
a única coisa que ela conseguia dizer era sim e não balançando a cabeça, ela
teve uma camada muito espessa do coração que foi afetada por conta das células da
covid que acabaram interrompendo a circulação elétrica do endocárdio, assim
dificultando com que os batimentos dela fluíssem com mais facilidade.
Como você se sentiu sendo um estagiário
e de repente você está ali atendendo uma paciente que passou pelo Covid?
Foi uma coisa meio delirante porque
você e a partir do momento que você entra na sala, você não pode sair, então
você entuba paciente, destuba paciente, paciente dessatura que é quando cai a
oxigenação, tem que correr ficar dentro da sala aflito porque as medicações
ficam do lado de fora, o número de profissionais durante a pandemia muito
reduzido que a maioria saiu para UTI para setores externos e o centro cirúrgico
foi fechado, então quem ficava era quem estava literalmente na linha de frente
na cirurgia de urgência e calhou dessa cirurgia entrar no meu plantão.
Essa paciente ela fez uma drenagem pleural
que é a drenagem do pulmão para ver se de alguma maneira ela ia conseguir
respirar melhor em ar ambiente não necessitar tanto de entubação da posição de
prona enfim, mas teve uma hora que ela dessaturou essa saturação dela de 100
caiu para 50 então quando o paciente entra em dessaturação, a gente já entra
com medicação e aumenta o fluxo de oxigênio se caso isso não resolver, o paciente
pode até entrar em uma parada cardiorrespiratória e como a gente partir do
momento que a gente entra em sala a gente não pode mais sair, a gente não pode
ter contato externo até que o procedimento acabe.
Tudo isso levou quanto tempo?
Então, esse procedimento durou 2h30,
ela tem que esperar acordar, anestesia que são coisas de 30 a 40 minutos, mais
uma hora para sala ficar trancada para ela se recuperar dentro de sala e mais
uma hora para higienizar sala, você perde 6h praticamente de sala de
procedimento por conta do Covid, foi uma coisa que complicou muito nossa rotina.
A pergunta que não quer calar: o
pós-Covid, como e quando será afinal?
A gente vai ter de alguma maneira
tentar enaltecer tentar reviver o significado que só a ciência é capaz e sem
ela a gente não consegue fazer nada, então por mais que você faça uma oração, a
parte espiritual você consegue agregar em alguma coisa, mas a parte física a
gente aqui em terra a gente tem que resolver de alguma maneira, então Deus me
protege, mas Deus deu a sabedoria para que nós possamos usufruir dela para o
nosso bem.
Nós sabemos que grande parte da
população brasileira que faleceram por covid, grande parte foi ignorância ou
por desinformação e por conta de tudo muito novo, o nosso maior chefe do
executivo negar o fato de que isso ainda exista é uma coisa que assim vai ser
muito difícil de sair de linha, por conta das variantes, enfim é uma coisa que
a gente ainda não tem controle por mais que inicie a terceira dose, enquanto a
gente não terminar apenas notícias verdadeiras a coisa só tende a piorar.